Numezu de Jorge Alexandre Moreira é um ótimo exemplo da importância da literatura de terror como um instrumento para examinar e enfrentar os demônios hediondos e medos paralisantes que assolam a alma humana. Dissecando as nuances do subgênero da possessão demoníaca discorre sobre aspectos essenciais dos relacionamentos humanos, em especial seu lado tóxico e putrefato, desde as motivações de uma pessoa para ajudar alguém que nunca havia visto antes até o claustrofóbico revolver das vísceras e cicatrizes de um relacionamento conjugal decadente.
Para isso utiliza como elemento catalisador de suas experimentações as relações entre erotismo e horror, explorando os territórios limítrofes entre dualidades opostas, da mesma forma que Clive Barker fazia na década de oitenta, como o prazer e a dor, o sagrado e o profano, atração e repulsa. O sexo na história funciona como um elemento de múltiplos sentidos, servindo tanto para alívio como para tortura. Histórias de possessão dialogam diretamente com o medo de perder o controle sobre o corpo e Numezu expande essa concepção para o campo da mente e da carne.
Raoul e Laura são um casal em crise que busca reascender as chamas da paixão e salvar seu casamento em uma viagem romântica pelo mediterrâneo. Isolados a bordo de um veleiro luxuoso em um cenário idílico esperam chegar a uma conclusão para quinze anos de mágoas e segredos. Entretanto o clima de cumplicidade se altera quando Raoul encontra uma estátua no fundo mar, uma figura obscena e monstruosa que encarcera um mal ancestral. Um horror que se alimenta de perversões que rasgam a alma humana em pedaços, cuidadosamente degustados com o sabor exótico do medo e desespero. E o que era uma viagem de casal acaba se transformando em um sangrento ménage à trois demoníaco.
Com uma escrita direta e ágil que utiliza um arsenal de imagens explícitas e perturbadoras para compor um mosaico moderno da violência que perpassa relacionamentos tóxicos, seja ela física ou psicológica, o livro oferece uma leitura arrepiante e visceral, ao mesmo tempo que presta homenagens a clássicos do gênero como O Exorcista, a obra-prima de William Peter Blatty, na associação óbvia entre a figura de Numezu e Pazuzu. Jorge Alexandre Moreira é cuidadoso na criação de sua figura demoníaca e suas visões do passado de Numezu são memoráveis e impactantes.
Em Numezu o demoníaco aparece como uma metáfora para a maldade humana. Todos nós temos monstros e demônios interiores, pequenas vozes que sussurram todo tipo de coisa destrutiva e maligna que poderíamos estar fazendo diante das mais diversas situações. Na maioria das vezes nós conseguimos ignorar esses impulsos e continuar como membros normais da sociedade. Mas isso não é o que acontece com o protagonista Raoul.
Numezu (2019) | Ficha Técnica
Autor: Jorge Alexandre Moreira
Editora: Monomito Editorial
Editora: Monomito Editorial
Páginas: 184 páginas
Compre: Amazon
Nota: ☠☠☠☠☠☠☠☠☠☠ (10/10 Caveiras)
Nota: ☠☠☠☠☠☠☠☠☠☠ (10/10 Caveiras)
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