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Resenha | Lágrimas do Dragão de Dean Koontz


Lágrimas do Dragão é o típico exemplo da completa bagunça que são as obras escritas por Dean Koontz nos anos noventa. É uma história repleta de ação, que se desenrola em um claustrofóbico espaço de tempo de poucas horas, e cuja estrutura narrativa é repetida à exaustão pelo autor ao longo da década: personagens bem construídos, mas mal aproveitados, são confrontados por fenômenos aparentemente sobrenaturais, sendo que seu impacto, mistério e suspense são dissolvidos ao longo do texto por meio de explicações científicas irritantemente didáticas e improváveis, coroadas por um final anticlimático e forçado. 

Outro elemento sempre presente em seus livros dessa época são comentários sociais conservadores e datados, que ou se baseiam em teorias da conspiração (não é a toa que durante a pandemia uma de suas  histórias voltou à tona como fonte de notícias falsas), ou são baseados em pânicos morais absurdos, como é o caso de Lágrimas do Dragão e seus preconceitos de classe. A sua concepção de mal está associada a representações imagéticas estereotipadas da classe baixa, que é apontada pela sua história como responsável pelo colapso social e moral do final do século XX. O vilão é literalmente apresentado como uma pessoa em situação de rua e seu horror advém inicialmente de seu aspecto físico descrito como "asqueroso e nojento".

O próprio título do livro faz referência a perspectiva de Dean Koontz com relação a pobreza, que não é vista por ele como um problema sistêmico, mas como uma questão pessoal. Lágrimas do Dragão é uma referência a uma suposta citação chinesa que compara a vida às lagrimas de um dragão, se o gosto dessas lágrimas é doce ou amargo depende inteiramente de como cada pessoa percebe o sabor. Essa ideia de que "só é pobre quem quer" permeia a narrativa na forma de dois arcos de personagens, uma mãe solteira que se vê em situação de rua após fugir com seu filho de um lar de violência doméstica e um executivo que se encontra na mesma situação por conta do vício em drogas, que apesar de apresentarem uma construção decente são completamente abandonados no último terço do livro e a forma como seus arcos são finalizados é um dos piores exercícios de preguiça e escrita do autor. 

Na história somos apresentados a dois policiais, que após se envolverem em um tiroteio que acaba com a morte do suspeito, passam a ser perseguidos por uma figura maltrapilha sobrenatural chamada Tique-taque, que assombra a existência das pessoas fragilizadas em situação de rua com seus ultimatos proféticos, conferindo às suas vítimas poucas horas de vida até uma morte brutal e sangrenta. Quando são ameaçados pela criatura, afirmando que estarão mortos dentro de dezesseis horas, iniciam uma busca implacável para compreender as suas motivações enquanto são lentamente envolvidos por um véu de morte e horror ao mesmo tempo que encontram pelo caminho outras vítimas de sua maldade. 

Se você já leu algum livro de Dean Koontz vai perceber que em Lágrimas do Dragão, além da estrutura narrativa, há uma repetição de todos os estereótipos de personagens que aparecem regularmente em seus livros: um dos protagonistas é um policial correto e sensível; a outra é uma personagem com problemas emocionais, que os esconde por trás de uma atitude durona que é derretida ao longo da história; uma criança inteligente que age como se tivesse o dobro de sua idade real; um cachorro ainda mais inteligente, cujas ações funcionam como uma espécie de Deus ex machina para a trama avançar; e um vilão que não tem nenhuma motivação racional além do fato de que ele é mau e ponto final. A própria premissa por trás dos poderes sobrenaturais é bem batida, o que torna a experiência de leitura nada memorável, não que ela seja totalmente ruim, mas é cheia de passagens e personagens familiares que você lembra de já ter visto em algum outro lugar, seja numa obra de Dean Koontz ou não.

Lágrimas do Dragão consegue contrariar a lógica e ser ao mesmo tempo uma narrativa ágil e lenta, mesmo com a ação contida em poucos minutos algumas partes se arrastam de forma dolorosa, como é o caso da cena inicial de perseguição e tiroteio policial que ocupa mais de cinquenta páginas. Essa sensação de lentidão é amplificada pela utilização de mais da metade dos pensamentos e diálogos dos personagens para instilar pânico moral e para o próprio autor reclamar da falta de moralidade do início dos anos noventa. Uma cena em uma rave repleta de jovens que era para ser o ápice da tensão na perseguição de Tique-taque se torna truncada e risível por conta de uma descrição extremamente conservadora e condenatória. O livro tem seus bons momentos, Koontz flerta com alguns conceitos interessantes, mas seu final, em comparação com a demorada construção narrativa, soa apressado e de pouca inspiração. Lágrimas do Dragão é um livro mediano, que oferece mais do mesmo que você encontra em qualquer outro livro de Dean Koontz, só que com menos qualidade.

   
  Lágrimas do Dragão (1995) | Ficha Técnica 
   Título original: Dragon Tears (1993)
   Autor: Dean Koontz
   Tradução: Alves Calado
   Editora: Record
   Páginas: 383 páginas
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   Nota:☠☠☠☠☠(6/10 Caveiras)

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